A cota de 50% das vagas das universidades federais para alunos das
escolas públicas fortalecerá o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e
ajudará a melhorar a última fase do ciclo da educação básica.
Interessados em conquistar uma vaga nas federais, que usam a nota do
Enem no processo de seleção, os estudantes e suas famílias pressionarão
as escolas por mudanças no currículo do ensino médio. A afirmação é do
ministro da Educação, Aloizio Mercadante, que descarta a hipótese de
intervenção direta na organização e na grade curricular, o que exigiria
reabrir um debate feito na gestão do seu antecessor, Fernando Haddad.
Segundo Mercadante, o MEC vai substituir a Prova Brasil pelo Enem na
avaliação do ensino médio do País. Por questões técnicas, não há prazo
para a mudança.
O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb)
divulgado anteontem mostra que houve piora no desempenho de 9 Estados e
do Distrito Federal no ensino médio. Quais seus planos para essa etapa
da educação?
A primeira diretriz é a substituição da Prova Brasil pelo
Enem como instrumento de avaliação da qualidade do ensino e aprendizado.
Temos de manter por mais um período a Prova Brasil para não perdermos a
série histórica. O Enem tem 1,5 milhão de alunos do ensino médio
inscritos neste ano, de um total de 1,8 milhão de concluintes de escolas
públicas. Ele já é uma avaliação censitária.
Então o sr. pretende tornar o Enem obrigatório para alunos da rede pública?
Não. O Enem hoje já é quase censitário, não precisamos de
nenhuma medida para ele ter esse papel no ensino médio. Não precisa ser
obrigatório. Só não posso fazer isso agora. Para manter a série
histórica, precisamos ter os dois exames ainda por mais um período. Há
um trabalho técnico e conceitual, porque a Prova Brasil avalia o sistema
e o Enem avalia o aluno.
Então a aposta do sr. para o ensino médio é o Enem?
O Enem vai ser cada vez mais importante, porque além do Sisu
(sistema de seleção de candidatos que fizeram o Enem para as
universidades federais) e do ProUni (programa de bolsas para
universidades particulares) vamos ter o sistema de cotas. Metade das
vagas das universidades federais será preenchida pelas escolas públicas.
Vai ter uma cobrança para colocar na universidade. Com isso, o Enem vai
contribuir para reestruturar o ensino médio. Ele está organizado em
quatro grandes áreas: matemática, língua portuguesa, ciências exatas e
ciências humanas. Essas áreas vão estabelecer as necessidades de
aprendizado dos alunos para o ensino médio. Essa reorganização
curricular virá do Enem. Vamos discutir com os secretários de Educação
para pactuarmos esse processo. Hoje temos 13 disciplinas obrigatórias e
deverá haver uma reestruturação em direção à matriz do Enem.
Mas o sr. pretende reabrir a discussão para mudar as
disciplinas do ensino médio? Quando o sr. diz que o currículo do ensino
médio perdeu o foco, o sr. pretende fazer algum projeto de lei ou
portaria com novas diretrizes?
Não, não é isso. Queremos usar o Enem para estimular essa
mudança, que é um processo muito mais rápido. O Enem vai se colocar como
grande instrumento de acesso à educação. O Enem já vai ser esse
elemento estruturante, ele vai reestruturar o currículo do ensino médio.
Os alunos, os pais e a sociedade exigirão da escola pública resultados
no Enem. A escola vai ser cobrada, então vai se adaptar naturalmente. O
principal indicador de qualidade vai ser quantos alunos cada escola
colocou no Enem.
Apenas o Enem será suficiente para melhorar o ensino médio?
O Enem será mais importante ainda na vida dos alunos da
escola pública. Outra coisa que queremos é estimular a escola em tempo
integral. O sistema já identificou que ela é um grande avanço em direção
à qualidade. Queremos fortalecer essa modalidade e essas parcerias. E a
terceira diretriz é a formação dos professores. Temos um volume muito
grande de professores que não têm a formação específica na competência
em que eles dão aula, especialmente em matemática, física e química. E
temos a tecnologia de informação. Queremos colocar a internet à
disposição dos professores e alunos. Os tablets são instrumento para
professores do ensino médio.
Desde 2009, já existe um modelo novo de ensino médio,
mais próximo do mercado de trabalho e da vida dos alunos, mas com pouca
adesão das escolas. Por que não investir nesse modelo?
Esse modelo é a busca de uma escola mais interessante para o
aluno. Nessa idade, se o aluno não se interessar, ele abandona a escola.
Então o ensino médio inovador é sim um caminho muito promissor. É a
busca de novas estruturas mais eficientes é um movimento que já está em
andamento.
Temos um terceiro setor ativo no Brasil, com
experiências e métricas importantes. É possível pensar num modelo em que
o privado venha com uma proposta de ensino e isso seja apoiado pelo
gestor público?
Estamos buscando tecnologia da informação para abrir mais o
leque de alternativas para as escolas, porque as redes que fazem essas
parcerias, e muitas já estão fazendo. As experiências estão sendo muito
bem avaliadas. Há uma parceria com a Fundação Lemann, que está
traduzindo as aulas do professor Salman Khan (ex-aluno do MIT e de
Harvard que torna disponíveis videoaulas no Youtube que já foram vistas
por mais de 70 milhões de pessoas). As redes estaduais estão comprando
tablets, por meio do pregão eletrônico organizado pelo MEC, que vem com
conteúdo completo, acesso ao portal do professor, material para motivar o
professor a estruturar as aulas. Há um grande interesse dos Estados em
comprar tablets para os professores. Essas parcerias e esses suportes
são muito positivos. E as aulas de tecnologia da informação agilizam
muito essas parcerias. Mas isso não pode ser feito em detrimento da
formação do professor, da valorização do professor e da relação com o
aluno.
Fonte: Estadao.